Festival de Inverno Campos do Jordão 2021
Num dia limpo e luminoso de inverno, uma pequena multidão acompanha com curiosidade a orquestra que toca ao ar livre. A música se inicia discreta nas cordas, para em seguida travar um diálogo com as madeiras, logo interrompido quando um clima tenso se instala. As cordas graves, os metais e a percussão intensificam a atmosfera que, no entanto, dá lugar a uma melodia folclórica. Os climas se alternam e, de costas para o público, um homem de pequena estatura, têmporas brancas e gestos vigorosos comanda os músicos.
Alguns podem ter ouvido uma melodia familiar: A Marselhesa, hino francês que se contrapõe a temas líricos. Os movimentos do regente se intensificam na medida em que os sons se tornam mais potentes. Até que, na praça lotada, a curiosidade vira espanto. Sem deixar de conduzir a orquestra, o maestro dá sinais para que toquem o sino da igreja. E para que os canhões do exército, trazidos especialmente para a ocasião, deem tiros. O final apoteótico é um estrondoso sucesso.
A praça central da Vila Jaguaribe, núcleo mais antigo da cidade de Campos do Jordão, acabava de ser palco de uma execução especial da Abertura 1812. A peça de Tchaikovsky, escrita em 1882, comemora o fracasso da invasão de Napoleão Bonaparte à Rússia. Habitualmente tocada em salas de concerto, tem os sinos da igreja e os tiros de canhão emulados pela orquestra.
Aquela tarde de 31 de julho de 1976 ficou marcada na memória do então governador Paulo Egydio Martins, mas também na de diversos moradores de Campos do Jordão, bem como na de todos aqueles que a presenciaram. Era o encerramento da sétima edição do Festival de Inverno de Campos do Jordão pelas mãos do maestro Eleazar de Carvalho, diretor do evento.
O clima de euforia e vitória talvez possa ser lido, hoje, como um momento de glória de um festival que cambaleou no início, passou por solavancos e sobressaltos durante toda sua história, mas que estava destinado a ser um marco indelével para gerações de músicos brasileiros. É difícil imaginar, aliás, que outros caminhos teria trilhado a vida musical brasileira sem o Festival de Campos do Jordão.